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15/06/15

admirável mundo-novo-português!

retirado do blogue da Anabela Magalhães


O caso do pai que abortou os filhos na escola 

12/06/2015
no Aventar 

por João José Cardoso

Os colégios internos sempre foram uma boa solução para pais que não estão para aturar os filhos. Mas há poucos, e são caros. 

Para democratizar o acesso ao sossego paterno e à tranquilidade materna, o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais, Jorge Ascensão, teve uma ideia: aulas 11 meses por ano. É a chamada massificação da irresponsabilidade parental, ou da estupidez, como preferirem. 

Nesta fase os pais ainda fariam o sacrifício de manter os filhos em casa à noite e fim-de-semana, dadas as dificuldades económicas que o país atravessa, mas poderia iniciar-se a reivindicação seguinte, os dormitórios escolares, a que se seguiria um calendário escolar flexível, em que cada aluno gozasse de férias em data coincidente com as do agregado, porque há que manter algum contacto com as crianças, não vá alguém esquecer-se do nome das crias. 

Abortadas as criaturas nas escolas, em Portugal que já tem das maiores cargas lectivas e um sistema de férias absurdo onde dois períodos se dividem às ordens de um feriado móvel, o problema da natalidade resolvia-se num instante. Era tudo a fazer portugueses, o mais idiotizados possível.


06/05/13

a escola é uma maçada?

É, mas não pelas razões apontadas no parágrafo abaixo, não só, não necessariamente.

Sérgio Niza: «O professor dá uma lição, depois faz uma pergunta, escolhe um aluno para responder e avalia o trabalho substancial que é feito em casa. O principal problema da escola está neste modelo de não-comunicação em que o professor usa mais de três quartos do tempo da aula para falar sem que os alunos participem ou estejam envolvidos. Assim não há diálogo possível. Poderá algum jovem ou criança suportar isto?» -- ler mais
de Keith Haring, Characters

Ora as coisas não se passam exactamente assim. Não sempre. Não em todas as disciplinas. A bem dizer e por orientação programatico-didáctica, não deveria passar-se assim em nenhuma disciplina.

É claro que a propalada diferenciação/individualização do ensino é uma treta, impossível de levar à prática em turmas demasiado grandes, sem professores nem horas de apoio disponíveis e/ou suficientes.

Apesar de tudo, é suposto o trabalho centrar-se no aluno, partindo de um qualquer material (um texto, por exemplo) que ele próprio explorará, com exercícios vários testando 'competências' várias. No caso de uma língua, por exemplo, testando a compreensão do que se lê ou ouve, a expressão escrita ou oral, os aspectos estruturais/funcionais.
Idealmente, os alunos trabalhariam sozinhos, em pares ou em grupo.
Idealmente, o professor circularia pelas mesas, sentar-se-ia com cada aluno, com cada par ou grupo que o solicitasse. Na prática, quase impossível. Um professor sentado, tentando prestar apoio individualizado, rapidamente tem a sala transformada num circo ou numa 'chatroom', o uso 'transgressor' do computador, sendo o caso, ou as conversas, as brincadeiras, as agressões, na proporção inversa da idade dos seus alunos.
É assim nas escolas por onde passei, o problema da indisciplina e do desinteresse generalizado agravando-se de ano para ano, estendendo-se a faixas etárias e níveis de ensino impensáveis desta passibilidade, anos atrás.

Para pelo menos 99% dos alunos, as aulas são, à partida, uma maçada. São-no ainda antes de entrarem para a sala, o recreio, as conversas com os amigos que interrompem a contra-gosto. As aulas são uma maçada, como é uma maçada (talvez ainda maior) ler um livro. 

Factores como o desvinculamento dos pais, a mediocridade dos meios de comunicação e uma cultura do facilitismo e do imediatismo veiculada e incensada pelas novíssimas tecnologias, entre outros, levaram a que, por exemplo na disciplina de inglês, a obra de leitura extensiva tenha, na última década e meia, passado de um romance de 200 ou 300 páginas para um conto de 10 que, ainda assim, a maior parte dos alunos não lê em casa. Que é dado na aula, trabalhado, supostamente anotado para eventual posterior consulta em teste que lhe avalie a compreensão. Pois nem assim. A maior parte dos alunos recusa fazer uma leitura dramatizada. A maioríssima parte não ouve as perguntas que o professor faz. Muitos (demasiados) não copiam nada do quadro, não tomam notas, não têm dúvidas nem põem questões. Grande parte dos alunos, pura e simplesmente, não quer saber.

Os alunos portugueses são tradicionalmente 'copiões'. Com o passar dos anos, desenvolveram técnicas de copianço (apoiadas sobretudo nas novas tecnologias e facilitadas pela tipologia de exercícios visando a avaliação de competências) tão eficazes como indetectáveis e que desafiam qualquer esforço de vigilância ou o recurso a diferentes versões do mesmo teste - ingénuo numa sala sobrelotada, implementado com relativo sucesso nos exames nacionais, com menos de metade dos alunos e o dobro dos professores.

O copianço é o 'desenrascanço' das nossas escolas. Alunos há que o praticam com afinco e êxito durante toda a sua escolaridade. Falham nas provas orais levadas a cabo no dia-a-dia, em testes periódicos ou nos exames finais, mas a avaliação das restantes competências dá-lhes muitas vezes a nota necessária para transitarem de ano. Empenhar-se nas aulas, estudar ... para quê? , se as artimanhas compensam, em prazer, facilidade e eficácia? Se, antes do teste ou do exame, entregam um telemóvel ou um iPhone e guardam outro no bolso ou nas cuecas?

Para mudar a ESCOLA, há que mudar a SOCIEDADE, não há volta a dar-lhe. Enquanto os pais permitirem que os seus filhos passem horas infinitas jogando num computador ou sistematicamente 'ligados' à TV ou a uma qualquer maquineta (inclusive à hora das refeições) , enquanto não os incentivarem a ler desde muito cedo, enquanto não lhes orientarem o uso dos tempos livres, nunca as aulas vão deixar de ser uma maçada.

Referi há tempos o relato de uma aluna que foi viver para a Suíça, de tempos a tempos vindo visitar a sua antiga turma. O que os ex-colegas se riram quando contou que os alunos suíços se levantavam mais cedo para ouvirem as notícias e que ocupavam os intervalos a ler ou a estudar; o que eles desacreditaram quando contou que não havia algazarra nas aulas, que se respeitavam os professores; que os 'chumbos' praticamente não existiam, tal era a vergonha da perspectiva, o controle dos pais para que os filhos 'cumprissem'.

É ... mundos estranhos onde se está com um objectivo. Onde o estudar, o aprender, são em si motivo de interesse, a motivação intrínseca. Mundos onde, talvez, a escola não seja uma maçada - não pelos malabarismos dos professores nas aulas, mas pelo diferente entendimento da sua existência, por parte dos alunos e respectivos encarregados de educação.
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06/02/13

uma escola ferida de morte-morrida

recebido via e-mail:

-- CARTA ABERTA

do Pessoal Docente e Não Docente da Óscar Lopes 

Morreu um de nós: um daqueles que zelava pela segurança de todos (alunos, funcionários e professores); o nosso elo mais forte, em pleno exercício das suas funções. 
de Munch, img esticada
Para evitar que um aluno maltratasse um colega fazendo perigar a sua vida, durante a aula, mesmo perante a pronta ação do professor e de um funcionário, foi pedida a intervenção dos vigilantes da escola para que aquele fosse conduzido à Direção Executiva, a fim de que esta acionasse os técnicos da Escola Segura. 
Desde o início do comportamento de extrema violência, materiais foram destruídos, funcionários e docentes ameaçados de morte verbalmente e agredidos fisicamente. O esforço dos vigilantes em controlar tais atitudes foi imenso, mas não conseguiram evitar a destruição descontrolada de mesas, quadros, armários, cadeiras e os atos de ataque físico. Já na Direção Executiva, e perante o continuado comportamento violento, o vigilante Correia, manietando o aluno, manteve-se como pilar determinante na segurança física de outros elementos da comunidade educativa, que tentavam também intervir. Mais de dez pessoas tentaram, sem sucesso, conter o aluno!

Assim, perante uma violência física e emocional tão demorada e brutal, o vigilante Correia colapsou. 

De imediato foi assistido por professores e funcionários que lhe fizeram as manobras de reanimação (respiração boca a boca e massagem cardíaca) até à chegada do INEM, que prestou toda a assistência possível que, no entanto, se mostrou ineficaz para salvar o Sr. Correia.

Estamos profundamente abalados e consternados com o falecimento do colega em pleno exercício das suas funções, num local, por excelência, educativo, onde uma morte nesta situação é inaceitável. Estamos de luto, estamos perante algo que não conseguimos aceitar e, por isso, não sentimos capacidade de gerir emocionalmente uma situação tão dramática; estamos na escola sem darmos aulas, incapazes de pedagogicamente abordar o assunto junto dos restantes alunos. Todos os que se encontravam na escola ficaram em choque.

Como pode isto ter acontecido numa escola? Que ambiente se vive? Que aprendizagens se fazem quando há quem possa frequentá-la enchendo-a de ameaças e de violência? O contexto escolar do Agrupamento está pormenorizadamente descrito no Projeto Educativo. Todos os profissionais que nele trabalham estão conscientes do universo em que se movem e procuram por todos os meios ajudar a orientar crianças e jovens de um meio problemático, com fragilidades várias, com comportamentos difíceis de gerir. Temos uma equipa técnica preparada e muito ativa, no âmbito dos recursos TEIP. Lidamos com os problemas que vão surgindo e conseguimos muitos resultados positivos.

No entanto, há sempre um pequeno número de alunos, bem identificados na escola, que ultrapassam todos os limites do aceitável numa comunidade escolar, pois põem em risco os seus membros, a nível físico e psicológico, de forma sistemática: não aceitam a autoridade de ninguém, pelo que não cumprem as regras da escola, nem as mais básicas de convivência; ameaçam; aterrorizam; agridem. 
Em relação a estes alunos já tudo foi feito, desde as estratégias aplicadas pelos professores e pelos diretores de turma para motivar o aluno para a aprendizagem e para a socialização, passando pelas medidas previstas no Estatuto do Aluno, completamente ineficazes para estes casos. Tiveram a intervenção do SPO, GAAF, ADEIMA, CPCJ, Tribunal de Menores. Aos diretores de turma são pedidos relatórios, pareceres, esclarecimentos de todos estes organismos.
Enquanto isto acontece e durante anos, a situação destes alunos na escola mantém-se inalterada, até os jovens saírem da escolaridade obrigatória ou terminarem o ciclo de estudos. Isto é, embora várias instituições estejam envolvidas, a escola tem de manter os alunos ou transferi-los para outras escolas, deslocando o problema, não resolvido, para os outros. Estes continuam assim a ameaçar e a agredir colegas, funcionários e professores, continuam a impedir os colegas das turmas em que estão inseridos de poderem ter um ensino de qualidade, minando as aulas. Têm e criam um sentimento de poder e impunidade, de ausência de limites, que é o oposto do que lhes deveria poder ser ensinado. A escola regular não pode dar a estes alunos a resposta de que eles precisam. A tutela não está a cumprir o seu papel, que inclui o de resolver a situação destes alunos e o de proteger o direito à educação e à integridade física e psicológica de todos os outros e de quem trabalha nas escolas.

Por estes motivos, dirigimo-nos à Tutela, exigindo que, com a maior urgência, se debruce sobre este problema e o resolva eficazmente, criando acompanhamento adequado às crianças e jovens com comportamentos disruptivos, que põem em riscos elementos da comunidade escolar em que se inserem. Este acompanhamento terá de implicar o afastamento destes jovens das escolas regulares e a sua integração em ambientes controlados, específicos e preparados para este tipo de perfil psicológico.

Morreu o Sr. Correia, dizemos. Já tinha problemas de saúde, dirão. Nos olhos uns dos outros lemos «Mataram o Sr. Correia». 

Matosinhos e EB 2, 3 Professor Óscar Lopes, 31 de janeiro de 2013 

Assinatura de docentes e não docentes

25/10/12

profs portugueses sofrem todos de 'burnout'!

Estudo - entrevista publicada na Visão: aqui
com Lusa 10:32 
Segunda feira, 1 de Outubro de 2012


Ser professor em Portugal é mais stressante que viver nos EUA 

de Egon Schiele

Os professores portugueses têm um nível de stress superior à população norte-americana, considerada uma das sociedades mais stressantes, conclui um estudo sobre o esgotamento físico e mental dos docentes portugueses.

[só é novidade para quem não é professor .. e é bom que os 'outros' fiquem esclarecidos ..]



Alexandre Ramos, autor do estudo sobre 'burnout' (esgotamento físico e mental) entre os docentes portugueses, explicou hoje à agência Lusa que, com base nas suas conclusões, "a grande maioria dos professores encontra-se em níveis médios e baixos de 'burnout', mas nenhum se encontra no estado de ausência [de 'burnout?], o que parece ser preocupante".
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"Se queremos preservar a qualidade de ensino nas escolas, é indispensável preocuparmo-nos seriamente e imediatamente com a saúde dos professores", alertou o especialista, que considera o problema preocupante por causa da qualidade de ensino nas escolas. [bom .. obviamente que Nuno Crato não conhece este estudo .. ou será que ..... (.. maquiavelismos meus) o despedimento de tantos professores foi, afinal, um acto seu de puro altruísmo? Uma tentativa de poupar, ao menos, aquelas dezenas de milhar ao efeito corrosivo da profissão? Vá, agradeçam-lhe, seus ingratos-piegas: desempregados, sim, mas não 'burnt-out'!!]
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O especialista realçou ainda que "os professores portugueses têm um nível de stress superior à população norte-americana", considerada uma das sociedades mais stressante e onde o valor (de 'burnout') é de 13,02.
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O psicólogo clínico e de aconselhamento explicou que o 'burnout' tem três dimensões: a exaustão emocional, a despersonalização e a perda de realização pessoal no trabalho.
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O nível de 'burnout' detetado por Alexandre Ramos era baixo em 35,8 % dos professores, médio em 43,8% e alto em 20,4%.
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"Nenhum dos professores inquiridos apresentava ausência de 'burnout', ou seja, condições nulas em exaustão emocional e despersonalização, nem pontuações elevadas na realização pessoal no trabalho", referiu.

Os fatores que o psicólogo clínico e de aconselhamento apontou como contributos para a situação de 'burnout' são "a indisciplina dos alunos, as más relações com os colegas de trabalho e com a direção, a carga objetiva de trabalho e a burocracia".

O investigador recordou que "um nível muito elevado de 'burnout' está altamente associado a problemas de saúde e absentismo no trabalho". Os sintomas de mau estar ocupacional mais relatados são a falta de tempo para a família e amigos, dores musculares, de coluna e de cabeça, perda de energia e cansaço, irritabilidade e perda de paciência com facilidade, esquecimentos e sentimento de falta de reconhecimento profissional. [óbvio, e não era preciso um 'estudo' para chegar a estas conclusões: bastava os senhores jornalistas falarem com professores .. ]

de Hans Bellmer, retirada daqui

Alexandre Ramos realizou dois trabalhos: um estudo na escola secundária de Camões (com 26 dos 140 professores) e outro a nível nacional, abrangendo 10 escolas. Quando comparou o nível de stress dos professores com dados obtidos em 2002, o investigador verificou, contudo, que se regista uma ligeira descida, passando de 19,17 para 17,45. [..devia ter vindo a uma escola da periferia .. margem sul, por exemplo..]

No entanto, realçou que "os professores portugueses têm um nível de stress superior à população norte-americana", considerada uma das sociedades mais stressante e onde o valor (de 'burnout') é de 13,02.

O investigador também concluiu que os professores menos propensos a 'burnout' são os de informática e avança uma possível explicação: "Talvez os níveis de indisciplina sejam menores nessas aulas, pois os alunos estão mais ocupados a trabalhar no computador".
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Por outro lado, as professoras tendem a apresentar níveis de "stress percebido" e alguns sintomas de mau estar ocupacional, físicos e emocionais significativamente superiores aos homens.

 Já os professores (homens) "tendem a revelar níveis mais altos de despersonalização ou cinismo, o que significa olhar para os alunos e vê-los como meros objetos", acrescentou.

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E pronto. Estudo feito (e ainda bem!). Notícia dada (positivo!) E agora .. caixote do lixo com ele, arquivo-morto, o que quer q não vá incomodar o yes-minister.
A vida continua. Os professores vão queimando mais uns fusíveis, quando já não aguentarem metem baixa, se a coisa for mesmo séria hão-de ser chamados a junta-médica. Que se encarregará de os pôr knock-out de vez!
Qualquer dia ponho aqui o relato da minha recente-péssima-experiência com uma das tais ..
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13/02/12

«E falam-me de revisão curricular?»


recebido via e-mail:

E falam-me de revisão curricular?
Um dia cinzento…professor... Para mim um dia triste, coberto de indignação, revolta, medo,  impotência e desolação.
M. Duchamp, descending a staircase
Ontem, em frente à Escola EB 2/3 Padre António Luís Moreira, nos Carvalhos – Vila Nova de Gaia, um Professor de Matemática, de 63 anos, foi violentamente agredido por três indivíduos de etnia cigana. Não. Não agrediu nenhum aluno. Não foi incorrecto com ninguém, nem tão pouco falou mais alto. O exemplo de civismo, educação, correcção e profissionalismo é a descrição deste nosso colega. Apenas mandou que uma aluna de etnia cigana se retirasse da sala onde entrou sem autorização e sem educação. Motivo este bastante para que a aluna comunicasse com os familiares que de forma selvagem se encarregaram do “ajuste de contas”.

Sou professora e tenho também alunos de etnia cigana. Terei provavelmente princípios de educação e civismo semelhantes aos da maior parte dos professores, como este colega. Corrijo todos os dias os comportamentos e atitudes que considero despropositados. Trato todos os alunos de igual forma, tendo como principio a igualdade de que todos falam com a “boca cheia”. Igualdade essa de direitos, mas também de deveres. Sim, porque não pensem que a igualdade só serve para ter direitos! O cumprimento das regras de civismo e respeito também fazem parte. E se um dos meus alunos achar que “cuspir em cima das secretárias” é um direito que ele tem? Isso vai contra o meu entendimento de respeito e educação e, como tal terei de informá-lo da necessidade de limpar a secretária que é de todos. Se a moda pega, terei com toda a certeza de pedir protecção policial para sair da escola.

Cada vez que tento visualizar a situação de agressão a que foi sujeito este professor, fico completamente de rastos, desmoralizada e sem motivação alguma para continuar a fazer aquilo que escolhi há muitos anos.

E falam-me em revisão curricular??
Podem fazê-las todas e todos os anos! Não é aí que se encontra o “cancro” da Escola/Educação. Podem aumentar as cargas horárias todas que quiserem! Os alunos não vão saber mais por isso. É o mesmo que tentar tratar o doente com a medicação errada.

A indisciplina grassa em grande escala e em percurso crescente na maior parte dos estabelecimentos de ensino do nosso país. É mais ou menos camuflada, numas ou noutras escolas, por interesses vários, desde directores a ministros. Mas está instaurada e cada vez com maior número de aderentes. A nós pouco nos resta fazer. Tentamos de todas as formas, nunca infringindo a lei ou ferindo os tão apregoados direitos do aluno, proteger os poucos que sabem para que serve a Escola, o Professor e a Educação. Mesmo correndo algum risco de, segundo os entendidos, traumatizar as crianças, ainda elevamos o tom de voz ou castigamos um ou outro aluno, na tentativa, quase inglória, de “salvar” mais um.

Sabendo que a missão primeira de educar compete aos pais e sabendo que poderemos ser verbalmente e fisicamente agredidos, arriscamos e transmitimos, sempre que achamos premente, os valores e princípios que os nossos alunos não trazem de casa, corrigimos atitudes, somos pai e mãe sempre que necessário. Recebemos mensagens escritas dos encarregados de educação revelando uma falta de respeito, educação e desconhecimento atroz, porque cansamos o seu educando com os trabalhos de casa. Somos ameaçados pelos pais e familiares dos alunos a quem dizemos que é necessário um caderno e uma caneta para escrever e que esse material é muito mais importante numa sala de aula do que um telemóvel…

E falam-me em revisão curricular??…

Não aguento mais medidas sem sentido e de nenhum efeito. Um médico não receita sem saber qual é o mal de um doente, ou não deveria fazê-lo.

Então como se quer tratar a Escola/Educação sem antes perceber, analisar, verificar onde está realmente o grande, imenso problema?

  • É urgente e inadiável impor a disciplina nas escolas portuguesas.
  • É urgente e inadiável que se percebam as diferenças de direitos e deveres entre um adulto e uma criança.
  • É urgente e inadiável que um professor possa ensinar quem quer realmente aprender.
  • É urgente e inadiável que o medo deixe de ser uma sombra permanente sobre as cabeças dos docentes do nosso país.
  • É urgente e inadiável que possamos intervir assertivamente e no imediato em situações que estão no limiar do humanamente suportável.
  • É urgente e inadiável que o respeito e educação que exijo aos meus filhos, possa exigir da mesma forma aos meus alunos.

E falam-me de revisão curricular??

É inadmissível que o professor seja obrigado a engolir os insultos de um aluno que tem mais ou menos a idade dos seus filhos quando em sua casa isso não é minimamente tolerável.

Não pensem que quero “a menina dos cinco olhinhos”. Não. Apenas penso que fomos exactamente para o outro extremo. Quase que me apetece dizer que se vive uma anarquia nas escolas. Gritar fere a sensibilidade das crianças, mas falar baixo não resulta pois estas não sabem estar caladas. Uma bofetada ou puxão de orelhas? Completamente desadequado. Isso só com os nossos filhos surte efeito. Aos nossos alunos traumatiza e marca para toda a vida. Talvez seja por isso, por tantos traumas destes, que a nossa geração cresceu, formou-se, trabalha e não espera que nenhum subsídio seja criado e nenhuma casa lhe seja oferecida.

Os meus vinte e cinco anos de serviço não me ensinaram a viver uma escola em que importa apenas que as crianças sejam muito felizes e acreditem que a vida é super fácil; que o trabalhar é apenas para os “totós”, pois a preguiça compensa e de uma forma ou de outra todos conseguirão fazer a escola; que independentemente de cumprirmos as regras teremos sempre direitos; que pudemos ofender de todas as formas possíveis e agredir sempre, pois o pior que poderá acontecer são uns dias de “férias” em casa; que de uma forma ou de outra, a culpa é sempre do professor.

O nosso colega está em casa, depois de uma tarde nas urgências do hospital, com cortes no rosto e muitos hematomas. Tenho o estômago embrulhado e um nó na garganta. Uma vida inteira dedicada a ensinar e a formar um futuro melhor para o nosso país é desta forma agraciada quase no fim da sua carreira. E quem está a ler e a sentir-se da mesma forma que eu perguntará: “ E a escola não age?” E eu digo-vos qual é a resposta: “Foi fora do recinto escolar.” Gostaram? Conseguem imaginar como será o estado de espírito deste professor de matemática? Já não falo das marcas físicas e das dores que deve ter, pois foram muitos pontapés e murros covardemente dados por três homens na casa dos vinte anos. Covardemente por serem três a agredirem um senhor de sessenta e três anos. Falo na dor psicológica, uma dor que não passa com analgésicos, que vai lá ficar muito tempo. Será a recordação mais viva que terá da sua longa carreira que está quase no final. Aqui fica a medalha de “cortiça” que recebe pela sua dedicação e entrega à escola e aos alunos. No final apenas fica o amargo de boca de quem tem consciência de que fez o melhor trabalho que pode, que entregou a melhor parte da sua vida e juventude aos seus alunos, que exerceu com toda a dignidade a sua profissão, respeitando sempre todos, engrandecendo o conhecimento de muitos.

Resta-me dizer que este dia cinzento tem toda a razão de ser e todos os professores se sentirão exactamente neste cinzento que porventura será a cor que melhor define os sentimentos de quem neste momento consegue imaginar-se no lugar deste professor.

Maria do Rosário Meireles Cunha
Professora na Escola EB 2/3 de Olival