- as imagens das colunas laterais têm quase todas links ..
- nas páginas 'autónomas' (abaixo) vou recolhendo posts recuperados do 'vento 1', acrescentando algo novo ..

do ser professor

08 Fevereiro 2009
há sempre alguém.. do ser aluno..
http://o-vento-que-passa.blogspot.pt/2009/02/ha-sempre-alguem.html?showComment=1264477780904

18 Maio 2009
as faltas dos professores: surrealismos 
http://o-vento-que-passa.blogspot.pt/2009/05/as-faltas-dos-professores-surrealismos.html

24 Outubro 2009
dos professores, das férias e das pausas 
http://o-vento-que-passa.blogspot.pt/2009/10/dos-professores-das-ferias-e-das-pausas.html
 
25 Outubro 2009
escola, sociedade: mais testemunhos (França. Alemanha)
http://o-vento-que-passa.blogspot.pt/2009/10/escola-sociedade-mais-testemunhos.html

25 Outubro 2009  
Bruxelas, escola e sociedade
http://o-vento-que-passa.blogspot.pt/2009/10/bruxelas-escola-e-sociedade.html



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28 de Janeiro de 2013:

o poder de que os professores tristemente abdicam


23 de outubro, domingo, 2011

..... e vêm-me à memória os meus dois anos de estágio, obrigados um e outro a concorrer a um distrito, sentença de quatro anos: condenada ao desterro, eu, ele. 1986 e aquela cidade-fantasma de santo andré, 150 km de distância e a casa acabada de comprar, o empréstimo as prestações os juros o filho de um ano, desculpa, amor, desculpa, pudesse eu voltar atrás. o companheiro em alcácer do sal e eu ali desterrada, o filho doente o infantário o estágio as idas a setúbal e os trabalhos, as aulas assistidas. as alergias. a cidade fantasma, a saudade. primeiro ano, antibióticos do natal à páscoa, o meu filho de um ano. as corridas para o hospital em lisboa, segundo ano. a casa da mãe, cento e cinquenta quilómetros, a gasolina o carro em segunda mão as saudades os fins de semana só. eu estreando-me em ansiolíticos. a dor. a dor. em 87-88 morri, morremos. 'subsídio'? só de sangue, vidros. três pedaços rotos quando uma simples-lógica-humana-desejada-permuta - inconcedida. "o vosso mal foi terem entrado pelas vias legais". o fim. sísifos numa peça de kafka, dois magros salários para três rendas, as viagens as lágrimas o infantário. o filho doente, doendo, longe e os remorsos os remorsos, remorsos. meu filho. desculpa amor, pudesse eu voltar atrás..

*
10/4/2011

eu não quero estar a corrigir testes a um domingo
avaliar trabalhos
pensar em notas
não quero estar encafuada em casa
sentada a uma mesa
e o sol lá fora
o mar ao fundo, chamando-me
na praia,
todas-as-avaliadas-pessoas deste país.
os risos na rua
os cães que ladram
carros que passam
e a efusão dos pássaros.
apaixonados,
primaveris.
o esplendor lá fora,
eu dentro
eu a ter que trabalhar.
eu professora.
é domingo.

 *

8/2/2009
SER PROFESSOR

quadro de Roman Morhardt
Aspectos que toda a gente parece ignorar sobre a profissão de Professor e que será bom esclarecer:


1º. Esta é uma profissão em que a imensa maioria dos seus agentes trabalha (em casa e de graça, entenda-se) aos sábados, domingos, feriados, madrugada adentro e muitas vezes, até nas férias! Férias, sim, e sem eufemismos, que bem precisamos de pausas ao longo do ano para irmos repondo forças e coragens. De resto, é o que acontece nos outros países por essa Europa fora, às vezes com muito mais dias de folga do que nós: 2 semanas para as vindimas em Setembro/ Outubro, mais duas para a neve em Novembro, 3 no Natal e mais 3 na Páscoa, 1 ou 2 meses no verão..


2º. É a única profissão em que se tem falta por chegar cinco minutos atrasado (5 minutos que equivalem a um tempo, de 45 ou 90 minutos!)


3º. É uma profissão que exclui devaneios do tipo “hoje preciso de sair meia hora mais cedo”, ou o corriqueiro “volto já” justificando a porta fechada em horas de expediente.

4º. É uma profissão que não admite faltas de vontade e motivação ou quaisquer das 'ronhas' que grassarão, por exemplo, no ME (quem duvida?) ou na transparente AR. 
 

5º. É uma profissão de enorme desgaste. Ainda há bem pouco tempo foi divulgado um estudo que nos colocava na 2ª posição, a seguir aos mineiros, mas isto, está bom de ver, não convém a ninguém lembrar…


6º. É uma profissão que há muito deixou de ser acarinhada ou considerada, humana e socialmente. Pelo contrário, todos os dias somos agredidos – na nossa dignidade ou fisicamente (e as cordas vocais não são um apêndice despiciendo…) , enxovalhados na praça pública, atacados e desvalorizados, na nossa pessoa e no nosso trabalho, em todas as frentes, nomeadamente pelo 'patrão' que, passe a metáfora económica tão ao gosto dos tempos que correm…, ao espezinhar sistematicamente os seus 'empregados' perante o 'cliente', mais não faz do que inviabilizar a 'venda do produto'!

7º. É uma profissão em que se tem de estar permanentemente a 100%, que não se compadece com noites mal dormidas, indisposições várias (físicas e psíquicas) ou problemas pessoais …

8º. É uma profissão em que, de 45 em 45, ou de 90 em 90 minutos, se tem de repetir o processo, exigente e desgastante, quer de chegar a horas, quer de "conquistar" , várias vezes ao longo de um mesmo dia de trabalho, um novo grupo de 20 a 30 alunos (e todos ao mesmo tempo, não se confunda uma aula com uma consulta individual ou a gestão familiar de 1, 2, ‘n’ filhos...)

9º. É uma profissão em que é preciso ter sempre a energia suficiente (às vezes sobre-humana) para, em cada turma, manter a disciplina e o interesse, gerir conflitos, cumprir programas, zelar para que haja material de trabalho, atenção, concentração, motivação e produção. Batemos aos pontos as competências exigidas a qualquer dos nossos milionários bancários, dos inefáveis empresários, dos intocáveis ministros! Ao contrário deles (da discrepância salarial e demais benesses não preciso nem falar) e como se não bastasse tudo o que nos é exigido …

10º. ainda somos avaliados, não pelo nosso próprio desempenho, mas pelos sucessos e insucessos, os apetites e os caprichos dos nossos alunos e respectivas famílias, mais a conjuntura política, económica e social do nosso país!

Assim, é bom que a 'cara opinião pública' comece a perceber por que é que os professores "faltam tanto" – leia-se ‘faltavam’ (*):

Para além do facto de, nas suas "imensas" faltas, serem contabilizadas também situações em que, de facto, estão a trabalhar :

- no acompanhamento de alunos em visitas de estudo,
- em acções, seminários, reuniões, para as quais até podem ter sido oficialmente convocados,
- para ficarem a elaborar ou corrigir testes e afins , que não é suficiente o tempo atribuído a essas tarefas ,
- ou, como vem sucedendo ultimamente, a fazerem em casa, que é o sítio que lhes oferece condições, horas e horas não contabilizadas do obrigatório “trabalho de escola”….



Para além disto, e não é pouco, há pelo menos, como acima se terá visto, toda uma lista de 10 boas e justificadas razões para que o façam.

Correcção :

as nossas faltas nem sequer são faltas! São dias descontados ao período de férias!


(*) 
agora praticamente não faltamos: 5 dias/ano de artigo 102 contra os anteriores 12 ou os 24 dias (2 por mês) do antigo artigo 4.º, alguém se lembra? Não faltamos, o que não se traduz necessariamente em maior produtividade, muito menos em mais qualidade:
  • Agora vamos para as aulas doentes, indispostos, mal dormidos, encharcados em calmantes (sim, em que acham que resulta o stress em que nos têm mantido nos últimos 3 anos?!).
  • Os testes que dantes ficávamos a corrigir (abdicando de dias de férias) demoram agora semanas e semanas a serem entregues aos alunos…
  • Nem temos, sequer, hipótese de ir ao médico, que nos obrigam a repor as aulas (a bem da ADD - escapamos apenas se estivermos presos, sabiam?) Mais: o nosso médico, que nos conhece há 20 anos, não pode atestar a nossa doença, se não for convencionado!! - aberrante, surrealista..


    E … também há quem, não dando uma única falta, tenha (nas aulas, em casa..) uma ‘rica vida’, acreditem!

AL, em 17/1/09
quadro de Roman Morhardt

14 comentários:

Anónimo disse...

Ser professor era então uma profissão ...

Agora querem que seja um emprego: mal remunerado, sem reconhecimento, sem estatuto de dignidade, e ainda por cima o bode expiatório dos "pecados" do país!!!
9 de Fevereiro de 2009 09:29

Anónimo disse...

Ser professor é uma profissão das mais NOBRES. Equivale aos poetas, criadores.
9 de Fevereiro de 2009 09:30

ana gouveia disse...

Sobre mudar as cabeças.... Elias Canetti, oriundo de uma família de judeus sefarditas, diz na sua autobiografia sobre os professores que conheceu na sua vida " A variedade de professores era espantosa, é a primeira variedade de que tenho consciência na vida. Que eles estejam ali em pé tanto tempo à nossa frente, expostos em cada um dos seus gestos,sujeitos a uma observação incessante, hora após hora o verdadeiro objecto de interesse, e não possam arredar pé, sempre durante o mesmo período de tempo, delimitado com precisão (...) é ainda uma escola que não é declarada como tal, uma escola que é a a da variedade dos seres humanos e, se uma pessoa a levar suficientemente a sério, a primeira escola assumida do conhecimento humano ..." Sejam bons ou maus professores , como ele diz mais à frente, são sempre marcantes. Ana Gouveia
9 de Fevereiro de 2009 09:31

ana gouveia disse...

E a propósito do faltar ou não faltar. Se um prof. falta, há pelo menos uma centena de pessoas que o ficam a saber e comentam ( cada turma tem 28 alunos , conta-se o pai , a mãe , os tios, os primos, os vizinhos...) um gajo qualquer deixa o casaco na cadeira em frente ao computador, vai dar uma volta e ninguém dá por isso. Se nos atrasamos 5 minutos temos falta, um gajo qualquer telefona e diz que está quase a chegar e está tudo bem ! Se estamos num dia menos bom não podemos escapar ...há , de hora a hora, turmas à espera de nos ver" comandar " ( e bem..) as operações...um gajo qualquer engonha e faz ,o que deveria fazer naquele dia, noutra altura. Quando saímos da escola continuamos SEMPRE a trabalhar, porque as aulas do dia seguinte têm que ser preparadas...um gajo qualquer só pensa no trabalho quando entra ao serviço ...Enfim !!! tinham que poupar dinheiro com alguém, nós somos muitos, ainda por cima temos como principal função lembrar que os neurónios são pra funcionar...:))ana gouveia
9 de Fevereiro de 2009 09:31

Anónimo disse...

É, queiram ou não, os professores são um grupo à parte na função pública.
O tipo de trabalho é absolutamente distinto.
O desgaste incomensurável, incomparável.
Como incomparável é o material humano com se lida.
As escolas NÃO PODEM ser comparadas a empresas! Só mesmo mentes muito perversas, muito distorcidas, para lhes imporem afinidades!
JL
9 de Fevereiro de 2009 09:32

al disse...

E que dizer do "ser aluno", nos dias de hoje?

Ora comparemos:
os pais, os professores deles, na sua idade, tinham metade das disciplinas, até ao 3.º ciclo.
Estavam na escola, regra geral, apenas no turno da manhã, ou no da tarde.
Tinham tempo livre.
Quando um professor faltava, confraternizavam.
Não vinha daí nenhum mal ao mundo -e isto, no tempo em que, à classe docente, se reconhecia o direito(necessidade?) de dar 2 faltas por mês, ao abrigo de um artigo para desconto no período de férias. Agora são 5 por ano!!
Os pobres alunos de hoje em dia vivem encarcerados numa sala, atolhados em fichas, sobretudo nas chamadas 'aulas de substituição'.
Não têm, praticamente, tempos livres, ou oportunidades para confraternizarem.
Passam 35 (!!!!) horas por semana na escola; ou mais, se lhes forem dados apoios.
Não vêem (como poderiam?) as suas famílias.
Não têm tempo para brincar.
Não vivem.
Não respiram.

9 de Fevereiro de 2009 09:33

José Godinho disse...

Houve alguém, algures, que reconheceu que "os professores são a base de qualquer profissão, os fabricantes de futuros..." não há como discordar porque além de formadores, ainda somos encarregados de educação de muitos dos nossos alunos, funcionários administrativos da burocracia escolar, magistrados ( participações, processos disciplinares), conselheiros e até confessores. Tudo isto nós fazemos diariamente, semana após semana, ano após ano. Este nível de responsabilidade requer gente especial, culta, sensata, cordata, assertiva, com um sentido de justiça muito apurado e prontos a reivindicar os seus direitos, já que cumprem para além dos deveres...afinal, bem diferentes dos tais "professorzecos" que falam certos "secretariozecos" de estado e outros asnos.
9 de Fevereiro de 2009 09:35

Anónimo disse...

Com este circo da nova avaliação dos professores (é bom não esquecer que os professores JÁ ERAM AVALIADOS!!)perderam-se de vista outros aspectos que enfermam a educação.
Poeira nos olhos da opinião pública, é o que é, para justificar o empobrecimento de uma classe, a dos professores.
Por que não dão o exemplo os 'senhores da governação'?
Por que não se lhes aplicam, a eles, as leis de vencimentos e reformas?
Não são eles afinal, e em última (primeira) análise, também FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS????

9 de Fevereiro de 2009 09:36

AL disse...

Contra a demagogia e os joguinhos sujos deste ME / governo (que não há-de mudar nunca de política..) seria bom que nós, professores, clarificássemos as nossas aspirações/ exigências / insatisfações, que:
- por um lado, não se limitam, nem de longe nem de perto, ao ainda vigente modelo de avaliação dos professores
- que são, ao mesmo tempo, sugestões para a melhoria do sistema educativo em Portugal.

É, ao fim e ao cabo, a contribuição dos que verdadeiramente estão 'por dentro' dos assuntos da Educação - agentes no terreno, que sabem identificar necessidades e erros, partindo, é óbvio, de PRINCÍPIOS EM TUDO CONTRÁRIOS AO ECONOMICISTA!!.

Se se podem dar 'esmolas' de milhões a bancos infractores, se continuam a atribuir-se reformas milionárias (em duplicado, triplicado,.. a políticos e gestores), se.. etc, etc, etc, ... com muito maior razão se deverá INVESTIR NA EDUCAÇÃO, que, queiram eles ou não, representa o futuro: da democracia, e do país.

Dizemos:

  • NÃO À DIVISÃO DA CARREIRA EM PROFESSORES E TITULARES
  • NÃO AOS HORÁRIOS SOBRECARREGADOS E ESBURACADOS
  • NÃO À BUROCRATIZAÇÃO DO ENSINO
  • PELO RESPEITO À DIGNIDADE DOS PROFESSORES
  • POR CRITÉRIOS DE EXIGÊNCIA E QUALIDADE
  • POR TURMAS MAIS PEQUENAS (não mais de 20 alunos)
  • POR CURRÍCULOS REDUZIDOS DOS ALUNOS (não mais de 10 disciplinas)
  • PELA EXTINÇÃO DAS NACs (áreas curriculares não disciplinares)
  • POR UM MAIOR SUPLEMENTO DE HORAS PARA OS DIRECTORES DE TURMA (equiparado a serviço lectivo)
  • POR UMA BOLSA DE PROFESSORES SUBSTITUTOS que acabe com a actual farsa das aulas de substituição
  • POR UMA BOLSA DE ANIMADORES SOCIO-CULTURAIS para ocupação de tempos livres para além do horário escolar e/ ou nas férias
  • POR CRITÉRIOS DE EXIGÊNCIA NOS CEFS E CURSOS PROFISSIONAIS
  • PELO RECONHECIMENTO DO DESGASTE INERENTE À PROFISSÃO
  • PELO DIREITO A PAUSAS (reais, para professores e alunos) AO LONGO DO ANO, à semelhança do que acontece na UE (onde, como nós, têm também 1 mês de férias no verão): 1 semana em Novembro, 2 no Natal, 1 no Carnaval, 2 na Páscoa e 1 no Pentecostes - Maio)
  • PELA REDUÇÃO DA IDADE DA REFORMA
  • PELO AUMENTO DAS HORAS DE TRABALHO INDIVIDUAL, A REALIZAR EM CASA e considerando tipo de disciplina, n.º de alunos e de níveis de leccionação, e idade!)
  • POR UMA ESCOLA PÚBLICA DE QUALIDADE
  • PELO FUTURO

9 de Fevereiro de 2009 09:50

AL disse...

«Somos demasiado pobres para nos darmos ao luxo de não investirmos na Educação!», disse, há uns anos, um qq governante da Índia.

É só vê-los agora, a economia crescendo, os seus técnicos, cientistas, etc, a serem recrutados (disputados) pelas maiores multinacionais..

9 de Fevereiro de 2009 09:37

Simplesmente Maria disse...

Pois, pois! Belíssimas palavras!!
Só espero que os professores inscrevam na vida dos portugueses a sua responsabilidade de contribuir para a criação e formação de seres livres, autónomos, pensantes, que compreendendo a sua dimensão e sentido humano, possam alargar a dos outros. Se permitirem que o medo lhes coma a alma, e se conformarem a papaguear frases e pensamentos alheios, preenchendo e assinando papéis que legitimam e propagam o que dizem contestar, então as suas alminhas já estão tão pequenas que já nada vale a pena. Mas por favor, poupem as lamúrias e queixumes dos desesperados que levantam o cotovelo para proteger a cara do próximo estalo certeiro e doloroso. Já chega de perpetuar a neurose colectiva e individual deste povo, caindo no jogo dos que os colocam sistematicamente na posição de defesa impotente dos ataques tortuosos, esgotando as forças necessárias para a acção correcta, realizada na hora certa e com o empenho necessário.
9 de Fevereiro de 2009 09:39

tiago martins, 12ºC disse...

Falou-se ali em cima do que é ser aluno e que mudou muito, com a alteração, nomeadamente, da carga horária semanal. Estou agora no 12º ano, passei sempre, mais ou menos "tremido" (quase sempre para o menos "tremido"...), apenas com uma negativa o ano passado, no final do 1º período a matemática A. Mas confirmo a existência de uma mudança profunda quer no lado docente quer no lado aprendiz. Lembro-me de, desde o 5º até cerca do 8º ano, ter aulas no período da manhã, com uma aulita (quando a tinha) de 45 minutos na parte da tarde. Geralmente de Educação física e, muitas vezes, à 6ª feira, para "descomprimir" a semana. Agora tenho um horário bastante acessivel, com tempo livre que é muito bem servido por nós (alunos), quer seja para irmos à nossa vida, quer seja para estudarmos. Mas olho com alguma tristeza para o horário de uma prima minha que entrou este ano para o 7º ano e que vive a um ou dois quilómetros de casa, perto de uma zona problemática, onde tem de entrar muitos dias às 8 e meia da manhã e sair às 6 e meia da tarde. Isto sem possiblidades de meios de transporte, vai sempre a pé. O mesmo se passa com o meu primo que entrou para o 5º ano, morador dessa mesma zona problemática. Há uma frase, um ensinamento de vida que gosto muito: "O idiota é o que se cala perante o que não sabe. O verdadeiro estúpido é o que fala do que não sabe". Agora, este governo, estas políticas educativas são as verdadeiras estupidezes, a verdadeira palavra transformada em lei de quem fala do que desconhece: a realidade das escolas. Porque se incham de orgulho quando se lhes dizem que a média nacional de matemática subiu 4 valores. Os portugueses baixariam 4 valores perante exames de outros países. Não é culpa dos professores. Eles fazem o que podem, muitas vezes muito mais! A culpa é de um programa sem margem de manobra que não deixa compensar falhas e enganos que tenham surgido em anos anteriores. A solução para um programa mal "programado"? Exames fáceis "para ver se safa a coisa". O verdadeiro estúpido é o governo, que emite decretos e estatutos sem conhecer a realidade. O idiota é o eleitorado que o elegeu, mas não teve culpa: antes da tempestade (leia-se eleições) vem sempre a calmaria.

A realidade dos alunos de hoje é muito diferente. Olho para os alunos de 3º ciclo de hoje, com as suas mochilas a rabentar pelas costuras (literalmente, não no sentido figurado), com uma má vontade (haja alguns que ainda quebram a média! De louvar!) de ir às aulas, com muito mais tempo de aulas que aquilo que eu tinha (35 horas, bolas!) e a única coisa que me vem à cabeça é uma palavra feia que não vejo conveniente colocar aqui.

Depois olho para os professores: cansados depois de uma noite mal-dormida, sem rendimento por causa de uma gripe que não puderam tratar porque não tiveram margem de manobra para ir ao médico e medicar-se convenientemente, com uma má-vontade de aturar um bando de cerca de 30 alunos, ouvi-los a todos, responder às suas dúvidas, dar a matéria de um programa extensissímo e ultra-condensado, fazer esquemas, fichas e apoios tais... E, mais uma vez, me surge a palavra feia.

E vejo a diferença dos alunos de hoje e dos alunos de ontem (eu fico algures no meio, que apanhei ainda as duas alturas). E vejo a diferença entre os professores de hoje e os professores de ontem. E penso que para ter havido tanta mudança ao nível destes dois conjuntos a culpa não é dos conjuntos. É de alguém acima, alguém que "manda". O verdadeiro estúpido.
E quando olho para o conjunto, de alunos de hoje, com professores de hoje, vem-me outra vez a palavra feia à cabeça e desta vez não se fica por aí, digo-a baixinho, murmuro-a. E a seguir, "enfim"...

9 de Fevereiro de 2009 09:42

Maria Teresa disse...

parabéns!
Excelente texto!
É enviar para todos os que não são professores, para compreenderem e valorizarem aqueles que tanto se esforçam por melhorar a sociedade humana.

9 de Fevereiro de 2009 09:43

ana calhau disse...

Realmente o texto é excelente - obrigada, Ana.

A situação chegou a um ponto em que se torna lamentável que todas as pessoas do país não estejam informadas do que realmente se passa

- REENCAMINHAR ESTE TEXTO PARA OS NOSSOS CONTACTOS É ALGO QUE DEVEMOS FAZER

- no ensino superior as coisas não estão melhores mas, é como diz a Ana Gouveia: "tinham que poupar dinheiro com alguém". É o que estão a fazer.

A nós (professores, alunos, pais, cidadãos não-finlandeses, etc.) compete-nos continuar a dizer: Não!
(amanhã e depois de amanhã e...)

9 de Fevereiro de 2009 09:45

*

18/5/2009
as faltas dos professores: surrealismos

quadro de Escher
Claro que nós, professores, estamos fartos de saber (lutar contra) isto, mas pode ser que alguém, fora da profissão, também leia, pasme .. veja como somos uma classe tão 'privilegiada'..

então é assim:

- do "Guia Avaliação do Desempenho" (na página da DGRHE): para efeitos de determinação do grau de cumprimento do serviço lectivo, no Item A1 da ficha, deverá ser tido em conta o disposto no artigo 103.º do ECD. O item A2 pretende avaliar a disponibilidade e o empenho do docente em garantir que as aulas previstas para as suas turmas são efectivamente dadas. Para este efeito, são objecto de apreciação todas as ausências, salvo quando o docente se encontre efectivamente em serviço (por exemplo, em visitas de estudo) ou no exercício do direito à greve.

Ou seja, um professor tem direito a faltar, por doença, por nojo... mas se não garantir posteriormente que essas aulas são "repostas", (=compensadas), é prejudicado na avaliação do seu desempenho.
Aliás, até o direito de faltar por desconto no período de férias (ao abrigo do artigo 102) lhe é retirado na prática .. [e a propósito: o resto da Função Pública continua a ter direito a 12 dias/ano, enquanto, para os professores, esse número foi reduzido para 5 (isto, convém lembrar, numa profissão - a única? - em que se tem falta por se chegar 5 minutos atrasado!! ]

Agora o 'mimo' é que, repondo o professor as aulas a que faltou (e em que, diga-se de passagem, foi substituído..) , ninguém lhe repõe, nem o que lhe é descontado no subsídio de alimentação, nem o(s) dia(s) de férias que perdeu!

Pois ... pergunto-me em que outra profissão isto acontece ..

Quanto aos alunos, fiquem sabendo que odeiam estas reposições. E (a meu ver com toda a razão), se fartam de refilar:
-"Então temos aula de substituição e depois ainda nos fazem cá vir fora do nosso horário para uma aula de compensação?! E com falta se não comparecermos???"
Agora imaginem um professor que, apesar de tudo, até falta bastante (situação só possível com atestado médico, para o próprio ou de assistência a filhos menores) e depois, porque quer ser avaliado com MB ou Excelente, repõe todas essas aulas a que faltou: os alunos deixam de ter tardes disponíveis no seu horário, lá se lhes vai o tempo de lazer, ou o que têm reservado para TPC e outros trabalhos! Fixe, não, papás e mamãs?

.. O que me pergunto (mas isso sou eu que sou chata), é que rendimento se tira disto, com todos os envolvidos revoltados, forçados a , desmotivados?

É .. o nosso ME cuida bem de todos nós - e pensa! pensa mesmo muito, muito, no resultado das suas congeminações!
Em vez de criarem uma bolsa de professores substitutos, que dessem verdadeiramente aulas de substituição (a única situação séria e eficaz, acho eu..) e reconhecerem aos professores um direito que está a ser alienado, o ME prefere ir-nos atirando a todos muita areia para os olhos.
Prefere insistir no que, a mim, me parecem ilegalidades.
Prefere instituir/perpetuar este circo das «aulas» de substituição que agora temos = acompanhamento de alunos = vinte e tal miúdos fechados numa sala, dando cabo da cabeça de um professor/ama-seca ..

Assim vamos longe, pessoal, vamos longe!


*

18/5/2009
escola pública: os pontos nos ii

sobre uma frase da Lídia Jorge, num post aí abaixo:
« a escola pública portuguesa precisa de proceder a uma revolução nos métodos de trabalho.»

Pois.. não sei se a 'revolução' de que a escola pública precisa' é mesmo ao nível dos métodos de trabalho. Não me parece.

Sempre que há mudança de partido no governo, a escola, o sistema educativo, sofrem revoluções / involuções - precisamente e apenas, a nível dos métodos / metodologias de trabalho e de ensino.

Sempre os vários governantes partem de um mesmo pressuposto/ falácia : a de que os responsáveis pelo insucesso do sistema são os professores, dos quais invariavelmente se espera que se adaptem e se renovem ao ritmo dos apetites de quem decide os destinos da educação.

Nos meus mais de 30 anos de serviço já experimentei ou aprendi sobre métodos e teorias das mais variadas, algumas perfeitamente mirabolantes: a sugestopedia, aquela com que me brindaram no estágio, e que era, ao tempo, o último grito das pedagogias em ciências da educação made in Boston, agora a novel e omnipresente revolução tecnológica ..

A tudo os professores vão dando resposta, acções de formação sobre acções de formação, trabalho de casa sistemático, malabarismos/ contorcionismos indiciadores de uma invulgar capacidade de adaptação/renovação que qualquer ME sério e atento aplaudiria de pé.

No entanto, e apesar - ou por causa de - tanta experimentação, melhorias palpáveis, realistas, no que concerne às aprendizagens dos alunos, honestamente .. nenhumas. Corolário lógico: a culpa, ao contrário do que pretendem os vários podres poderes, alguns  iluminados personagens da nossa praça, não é dos professores.

Alteram-se os métodos de trabalho, as metodologias de ensino, a prática pedagógica. Um vector, no entanto, permanece:  a 'macro-visão' do sistema educativo, mais as suas vertentes operacionais: os curricula e o sistema de transição dos alunos durante todo o período da  escolaridade obrigatória, minado de disposições facilitistas apoiadas por uma rede burocrática 'infurável'.

Vejamos algumas aberrações, no que respeita ao sistema de transição:
  • os alunos do ensino básico (2.º e 3º ciclos, do 5º ao 9.º) podem transitar, ano após ano, com avaliação negativa a 3 disciplinas, que, previsivelmente, até serão sempre as mesmas..
  • duas dessas disciplinas podem ser, por exemplo, a matemática e o inglês - ano após ano, até concluírem o 9.º
Que ilações retiraria qualquer pessoa sensata destas circunstâncias? Que consequências advêm deste sistema de progressão? Basicamente, duas: iliteracia funcional e interiorização do facilitismo, por parte, quer dos próprios alunos, quer dos seus encarregados de educação, ambas, por seu lado, conduzindo a outras situações perversas:
  • o elevadíssimo insucesso no 10.º ano /abandono escolar no ensino secundário, porque regido por diferentes regras; 
  • o desinteresse e a indisciplina - em pelo menos 3 disciplinas - factores predominantemente inibidores das aprendizagens, e que grassam nos ciclos de escolaridade obrigatória. Estendê-la ao 12.º ano será um erro crasso enquanto não forem corrigidas as disposições que agora vigoram.

E vem-me à memória um inquérito do jornal Público, em que se inquiriam 'personalidades' sobre as causas do insucesso escolar (efectivo) em Portugal.
A pergunta era: «Acha que a culpa do insucesso é dos professores?»
A resposta de uma das inquiridas, Inês Pedrosa, escritora e directora da Casa-Museu Fernando Pessoa, mais ou menos isto :
« É óbvio que a culpa é dos professores! Os alunos não hão-de ser todos burros!»

pois..
da boçalidade da resposta não vou nem falar..
Mas tem razão a senhora: os alunos, na sua grande maioria, de 'burros' não têm nada. Nem, de resto, os alunos que reprovam são os que têm 'dificuldades de aprendizagem'.
Os alunos que reprovam são aqueles que não querem saber da escola para nada - secundados e incentivados nesta perspectiva pelos seus EE.
Os alunos que reprovam são os que se portam muito mal e fazem da sala de aula uma extensão do recreio, prejudicando-se a si e aos colegas.
Os alunos que reprovam são aqueles cujos pais só aparecem na escola para insultarem os professores, carrascos implicantes que traumatizam os seus impolutos 'anjos'.

Os alunos que reprovam, em última análise, são os que, inteligentemente, intuíram os valores de facilitismo e auto-desresponsabilização subjacentes ao sistema educativo - desenhado e mantido ao longo das últimas décadas - pelo ministério da educação.