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18/06/13

« .. as virgens distraídas»

Segunda feira, 17 de junho de 2013 

por Daniel Oliveira

fonte

A greve, a ansiedade nas escolas e as virgens distraídas (atualizado) 

Perante a possibilidade dos estudantes fazerem um exame mais tarde (porque, como é evidente, acabarão por ter de o fazer), Nuno Crato, em vez de negociar com os professores o conteúdo das medidas que levaram a esta greve, tentou negociar a própria greve. Mudava a data do exame de hoje se os professores se comprometessem a não fazer mais greves. 
Nuno Crato não percebeu que o objetivo da greve é obrigar o governo a negociar, não a data dos exames, mas as gravíssimas medidas que unilateralmente impôs aos professores e aos funcionários públicos? Percebeu muito bem. Mas também percebeu que a ansiedade dos estudantes e pais rende. E, à custa da do conflito, quer ganhar uns pontos na sua popularidade. Não me espanta. Apesar de não o parecer, Nuno Crato é um dos ministros mais politiqueiros deste governo. 

Crato, com um coro de comentadores que acham excelente o direito à greve desde que seja inócuo, queixa-se da instabilidade que está a ser causada nas escolas. Querem falar de instabilidade? Podemos falar da que ele próprio está a causar quando, sozinho, decidiu suspender o programa de matemática que comprovadamente melhores resultados conseguiu nas escolas. Porque ele não gosta do programa e longe vão os tempos em que o colunista Crato criticava o centralismo autoritário do Ministério da Educação. Estamos a meio de junho e os professores de matemática não sabem que programa vão dar para o ano. Ainda não há manuais e logo se irá improvisar. Isto é a instabilidade que me preocupa porque sou dos que pensam que a escola serve, antes de tudo, para ensinar. Só depois para avaliar. 

Instabilidade nas escolas? Mas haverá maior instabilidade do que aquela que é causada pelo terror que Crato espalhou nas escolas, com milhares de professores a desconhecerem em absoluto quanto tempo faltará para que fiquem desempregados? Julgará o governo que isso não se sente nas salas de aula? 

O governo quer falar do prejuízo para os estudantes? E que tal falarmos da redução de verbas para alimentação de alunos desfavorecidos, que hoje experimentam a fome na sala de aula por causa da criminosa política de austeridade? Ou do aumento do número de alunos por turma, que torna o acompanhamento aos estudantes com mais dificuldades numa impossibilidade. Ou do ataque ao enriquecimento curricular, que deixará milhares de famílias sem saber o que fazer aos seus filhos quando estes saírem das aulas. 

O governo quer falar de prejuízos para a educação e para o País? E que tal falarmos dos 40% de estudantes que, indo fazer os exames do 12º ano, já sabem que não querem concorrer à Universidade? Um percentagem sem precedentes na nossa história recente que se explica pelas dificuldades financeiras das famílias, incapazes de comportarem os estudos por mais um ano que seja. 

O governo quer falar de ansiedade? Falemos da sua tentativa de adiar o pagamento dos subsídios aos funcionários públicos, violando uma decisão do Tribunal Constitucional e não permitindo que estes saibam se podem pagar dívidas, como podem gerir o seu orçamento familiar ou se irão de férias. 

Pode um governo que espalha o medo, a ansiedade e a dúvida permanentes em toda a sociedade usar a ansiedade de estudantes e pais por causa de um exame em seu favor? Pode. Porque a hipocrisia não tem limites. 

Por dever de solidariedade com quem resiste à arbitrariedade, compreendo que entre o risco do desemprego e um exame, os professores escolham defender o seu posto de trabalho. Mesmo que isso me cause, como pai, ansiedade. Porque sei que os prejuízos que este governo está a causar ao País e à Escola Pública são incomensuravelmente superiores aos que sejam causados por esta greve. Porque sei que a escola que Crato está a construir e aquela que ele está a destruir são assuntos bem mais relevantes do que a data de um exame. Porque sei que a infinita irresponsabilidade deste governo é bem mais destrutiva do que uma greve a um exame. 

Provavelmente Nuno Crato vai conseguir, através do esquema de convocar todos os professores e da redução drástica das exigências que sempre existiram para a vigilância às provas, realizar, com uma pequeníssima minoria de professores que não adiram à greve, muitos exames. A questão é se pode continuar a ser ministro com toda a comunidade escolar contra ele. 


Atualização: a estratégia de Nuno Crato, de virar os estudantes contra os professores grevistas, está a falhar. Os estudantes manifestam-se, sim, mas contra a trapalhada do Ministério da Educação, que cria a situação de haver alunos com exames e outros sem os poderem fazer. Em Braga, houve mesmo estudantes que invadiram as únicas sete salas (de 23 previstas) onde decorriam exames. E de todos os relatos que chegam a revolta é contra o Ministério e não contra os professores. É que os professores têm uma vantagem em relação a Nuno Crato: estão na escola e contactam com os seus alunos. E têm outra: não fazem parte de um governo que manda os jovens emigrar.
 

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