contrariando a alegada LEGITIMIDADE,
preâmbulo:
Cavaco Silva foi reeleito para um segundo mandato como Presidente da República com 2.209.227 votos, num universo de 4.431.849 votantes. (...) estavam inscritos para votar nas eleições presidenciais de 23 de janeiro 9.435.050 eleitores (fonte)
As eleições de hoje [23/01/2011] tiveram uma abstenção recorde em presidenciais - 53,37 por cento. Votos brancos e nulos também atingiram pico histórico. (fonte)
- fonte: (...) foram apontados "erros" e "incorreções" no apuramento, designadamente a omissão de cerca de 120 mil eleitores e 60 mil votos no distrito de Setúbal e a contabilização a mais de 40 mil eleitores e 20 mil votos em Viseu. [... estranho ... enquanto se retiram eleitores de Setúbal, acrescentam-se em Viseu .. o 'Cavaquistão', lembram-se?]
img daqui |
O Presidente emitiu uns sons que não podem deixar de ser escutados
O Presidente da República tem poucos poderes. O da palavra é um deles. E em momentos de crise deve usá-la com cautela mas eficácia. O Presidente saiu de casa ao fim de mais de um mês. Que se saiba, não estava de férias. Ia dizer que nós não lhe pagamos para viver num palácio. Pagamos-lhe para fazer política. Mas não é verdade, porque nós não pagamos ao Presidente da República. Num ato de enorme elevação institucional e respeito pelo cargo que ocupa, o Presidente preferiu ser pensionista, porque sempre recebia mais. Pouco, no entanto, já se sabe. Será que já aderiu aos "Indignados do Pinhal"?
Dizia eu que o principal poder do Presidente é a
palavra. E Cavaco Silva foi finalmente à rua (o passe está pela hora da
morte e, como se sabe, a reforma não é generosa). Na inauguração duma
moagem e usou-a finalmente. [aqui] Primeiro, explicou o seu silêncio. Não quer
"protagonismos mediáticos" que, diz, são "inversamente proporcionais" à
capacidade de um Presidente "influenciar as decisões tomadas por um País".
Cavaco dá-nos sempre a entender de que quando não parece estar a fazer
nada é porque está a fazer imensas coisas. Nós é que nunca percebemos o
que faz exatamente. Até porque sempre que toma decisões elas são ou
inconsequentes ou redundantes ou as duas coisas em simultâneo - como
quando enviou para o Tribunal Constitucional o orçamento que já tinha
sido enviado pela oposição com dúvidas que não tinha tido no orçamento
anterior. Mas devemos ter confiança no seu mutismo. "Ninguém tem a experiência que eu tenho",
explicou. Assim como nunca se engana e qualquer um tem nascer duas
vezes para ser mais sério do que ele. E, falta acrescentar, ainda está
para vir alguém mais modesto do que Aníbal Cavaco Silva.
Falou para dizer coisas que marcam a vida política
portuguesa e são um contributo fundamental para devolver confiança aos
portugueses. Sobre a crise, disse que "só poderá ser vencida com a ajuda dos empresários".
Uma afirmação que abala todas as falsas convicções que muitos têm em
relação à nossa situação económica. Sobre o alargamento dos prazos de
pagamento dos empréstimos disse que foi "um passo positivo ". Defendeu
que a União Europeia deve "passar das palavras aos atos", o que fez tremer Bruxelas perante tanta ousadia política.
Mas foi sobre as manifestações que teve as palavras mais contundentes: "as vozes que se fazem ouvir não podem deixar de ser escutadas".
É, diz-se, uma das principais características do que se faz ouvir: não
poder deixar de ser escutado. Diria que acontece o mesmo ao se faz ver.
Não pode deixar de ser visto. O que se faz cheirar consta que também não
pode deixar de ser cheirado. E, como dizia o saudoso César Monteiro,
assim sucessivamente.
Das duas uma: ou o Presidenta fala muito e no meio vai
dizendo umas coisas importantes ou fala pouco e quando fala marca a
vida política. Cavaco fala pouco para, quando fala, percebermos porque
estava calado: não tem rigorosamente nada para dizer. Na
realidade, eu próprio tenho defendido que, perante a crise social
profunda que vivemos, o presidente deveria falar. Depois ele fala e eu
próprio me pergunto o que raio esperava que o campeão nacional da
banalidade dissesse. Se não deveríamos tratar o Chefe de Estado como um
mero pensionista de luxo, retirado da política e a viver num lar em
Belém.
Nesta crise, o Presidente até poderia ter uma função
fundamental para a credibilidade da política. Podia fazer presidências
abertas, por exemplo. Ou ajudar a dirimir conflitos sociais. Ou falar em
nome de um País desesperado, deprimido e revoltado. Ouvir as pessoas,
dar voz e rosto aos seus problemas. Mas para isso era fundamental que
tivéssemos mesmo um Presidente. Alguém que sabe escutar e ver o que não
pode deixar de ser escutado e visto.
Se o atual Presidente tem experiência política - que
lhe permite sempre sobreviver sem correr qualquer risco -, nós, ao longo
de várias décadas de convivência, também a temos. E sabemos que o seu desígnio político se resume em três palavras: Aníbal Cavaco Silva. O resto vem sempre depois. E, por agora, caladinho é que se está bem. Se é para desconversar, também me parece.
Daniel Oliveira
Daniel Oliveira
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