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22/10/11

a oeste .. nada de novo ..

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enviado pela Sílvia :)

«Pode ser legal, como eles argumentam, mas é imoral!


No dia em que vem a público o facto de que, no próximo ano, me vão à carteira de modo violento, vil, em claro abuso de poder e seguramente sem precedentes, remeto uma notícia que saiu há alguns dias, e que por
"alguma" razão não recebeu a atenção devida.
Escandaloso! Que pelo menos tenham a dignidade de dar o exemplo!!!»

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Não têm, querida Sílvia .. e dar o exemplo é opção que nem se lhes põe!
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E eu, que sou ingénua e idealista, utópica qb, pergunto-me .. esta gente não tem problemas de consciência? Não os incomoda o facto de haver milhares de compatriotas seus que, neste momento, não têm, sequer, dinheiro para comer? Para alimentar os filhos? Gente que conta cada tostão, que se fixa no calendário como se pudesse antecipar o fim do mês, a casa para pagar, as contas acumuladas do supermercado e os juros, os remédios que deixou de comprar, felizmente o inverno tarda, este sol que parece compadecer-se de quem virá a ter frio, frio até na alma, e as contas por pagar, as contas que crescem e se acumulam e os cortes que vêm e os que virão, a impossibilidade a depressão a violência e a loucura, morte.
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E são os velhos e as velhas, sozinhos, doentes, miseráveis. Pensionistas presumidos de deverem tudo a todos, como se não tivessem passado uma inteira vida trabalhando, descontando, esperando que.
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E são os desempregados tantos deste país e o desespero que lhes sei, o futuro só emigrando, assim tenham a idade pouca, as forças muitas.
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de Max Ernst, 'o triunfo do surrealismo', 1937
E são já, também, os ditos 'remediados', os ex-classe média-que-desapareceu deste mapa, triste.
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Sei melhor de professores, do que oiço todos os dias. E sei de mim e do tão perto que estamos todos de nos tornarmos sem-abrigo, as casas que durante décadas nos incentivaram a comprar, só isso que fosse. 99% de pobres; de muito pobres; de pobres extremos. Mil e quinhentos euros por mês cotejados com dez mil, cem mil, cem milhões.

E eles .. Eles - a quem um cartão, laranja, rosa, garantiu a vida-airada, o futuro certo. Eles - que têm a desfaçatez de me pedirem sacrifícios, ano após ano, após ano, a pequenez do meu salário justificado por crises sucessivas - e já lá vão 20, 30 anos, a minha magra, incerta, futura reforma e eles multiplicando as suas, pobres só de princípios, idiotas sem remorso e sem perdão.
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E penso .. quando estivermos todos mortos de fome de frio de cansaço, tristeza, morte morrida, quem vai sobrar para lhes pagar, a eles, a vida fácil, a prosápia que se permitem, a des-existente consciência?

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excerto da notícia:
Dois membros do Governo vão receber um subsídio de alojamento de 1150 euros mensais, isto apesar de serem proprietários de uma casa na região da grande Lisboa.

De acordo com um despacho publicado em Diário da República, dois ministros e sete secretários de Estado terão direito a este apoio do Estado, por terem residência permanente a mais de 100 quilómetros da capital. Miguel Macedo, ministro da Administração Interna, e José Cesário, secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, são dois dos nomes abrangidos. Mas têm uma particularidade. De acordo com a declaração de rendimentos entregue no Tribunal Constitucional, ambos têm casa própria em Lisboa.

Estes casos não merecem ressalva na lei – um decreto de 1980, assinado pelo então primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro, e pelo ministro das Finanças, Cavaco Silva

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pois. e vêm-me à memória os meus dois anos de estágio, obrigada a concorrer a um distrito, sentença de quatro anos: condenados ao desterro, eu, ele. 1986 e aquela cidade-fantasma de santo andré, 150 km de distância e a casa acabada de comprar, o empréstimo as prestações os juros o filho de um ano, desculpa, amor, desculpa, pudesse eu voltar atrás. o companheiro em alcácer do sal e eu ali desterrada, o filho doente o infantário o estágio as idas à ese de setúbal, a sugestopedia, os trabalhos, as aulas assistidas. as alergias. a cidade fantasma, a saudade. primeiro ano, antibióticos do natal à páscoa, o meu filho de um ano. as corridas para o hospital em lisboa, segundo ano. a casa da mãe, cento e cinquenta quilómetros, a gasolina o carro velho as saudades os fins de semana-só. eu estreando-me em ansiolíticos. a dor. a dor. em 87-88 morri, morremos. 'subsídio'? só de sangue, vidros. três pedaços rotos quando uma simples, lógica, humana, desejada permuta. - inconcedida, "o vosso mal foi terem entrado pelas vias legais". o fim. sísifos numa peça de kafka, dois magros salários para três rendas, as viagens as lágrimas o infantário. o filho doente, doendo, longe e os remorsos os remorsos, remorsos. meu filho. desculpa amor, pudesse eu voltar atrás..

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