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16/06/13

o dia em que TUDO pode mudar

Day &Night, de Man Ray

É amanhã que tudo se joga neste braço-de-ferro entre o ministro da educação/governo e os professores. 


Tento pôr-me no lugar do 'outro', dos professores que vão boicotar a greve. 

Habituei-me, durante anos, a ouvir-lhes os argumentos tíbios, disparatados, que os levavam a não lutar nunca por coisíssima nenhuma.
A vê-los, mais tarde, surpreenderem-se com a tempestade que lhes desabava em cima, desacautelados. Enraiveci-me com a sua apatia-sempre, a sua bovina aceitação de absolutamente tudo.
Indignei-me, praticamente sozinha, perante os muitos que, a qualquer novo desvario do ministério, me contrapunham o arrazoado do «É a lei, tem de se cumprir!». E fui-me habituando a ser olhada como irrealista e utópica, demasiado 'revolucionária', praticamente uma louca furiosa e contestatária, uma 'outsider' naquele rebanho manso. 

Sei que há professores que não fazem greve "porque sim". Que há professores que nunca fizeram greve, "porque não". 

Mas fui-os ouvindo a todos, também durante anos, a queixarem-se das políticas do ministério, da vida na escola, dos alunos. A queixarem-se sistematicamente, na sala dos professores, à mesa do café.
Vi-os em todas as mega-manifestações dos tempos de MLR, protestando. E vi-os, logo depois, regressarem às escolas, o rabinho entre as pernas, cumprindo tudo aquilo contra o que, na véspera, se tinham insurgido.

E fui-os vendo deprimirem-se, cada vez mais stressados e impotentes, cada vez mais vencidos. Vi-os chorarem a meio de reuniões, à saída das salas de aula. Vi-os emagrecerem até aos ossos ou comerem compulsivamente, as olheiras um poço fundo de cansaço e desânimo, as caras fechadas, a depressão adentrando-se.

Sei-os cada vez mais esmagados de trabalho, afundados em papéis, enterrados em reuniões.
Não sei se eles sabem que o que lhes estão a 'cozinhar' lhes vai tornar o purgatório em que agora se debatem (iniciado pela sinistra MLR, convém não esquecer..) num inferno ainda mais insuportável:
o desemprego para uns, mesmo os que nunca o esperariam agora, depois de 20 ou 30 anos de ensino,
a sobrecarga de trabalho para os que ficarem, as turmas em maior número e sobre-lotadas, os alunos cada vez mais indisciplinados, seleccionados "por baixo" quando os que ainda aspiram a alguma coisa se transferirem para o privado.. 

Pergunto-me o que irá pela cabeça dos professores que, amanhã, não vão fazer greve .. 
Esperarão eles que os outros, os colegas que agora e de novo atraiçoam, consigam sozinhos as vitórias por que todos anseiam? 
Estarão eles tão anestesiados, que só se arrependerão de não terem ido à luta quando não puderem pagar a hipoteca da casa, a comida, os estudos dos filhos? 
Quando forem a bater com a cara no chão, o esgotamento ou o AVC anunciados, previsíveis? 
Terão eles medo da própria sombra? De "dar a cara" por uma causa? De que lhes cobrem 'ousadias' ou os apedrejem em praça pública os vizinhos, a cabeleireira, o merceeiro? 

Tento pôr-me no lugar do 'outro', não consigo.
Não aceito a falta de solidariedade, a inviabilização da luta dos colegas.
Não concebo que profissionais com um elevado nível de escolarização, com a responsabilidade cívica que lhes advém da própria profissão, possam revelar-se tão insensíveis, tão ignorantes de tudo o que está em jogo nesta luta, basicamente, a sobrevivência do estado social, da democracia, do próprio país. E da dignidade. 
A dignidade de dizer BASTA!
A dignidade de recusarem a chantagem dos que da lei respeitam NADA. Dos que deles sempre têm feito um capacho e se preparam agora para os esmagar DEFINITIVAMENTE, assim haja quem, como gado para um matadouro, corra, solícito e borrado de medo, a acatar a ignóbil convocatória.

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