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29/05/13

retirado daqui 
por António Pinho Vargas

As palavras que Pacheco Pereira raramente usa. 

Julgo que José Pacheco Pereira será talvez dos políticos/comentadores aquele que faz as melhores e mais certeiras análises da situação política portuguesa. Mas penso igualmente que, apesar da sua perspectiva muito crítica sobre este governo de radicais neoliberais ser correcta de vários pontos de vista, lhe falta, quase sempre, o uso de algumas palavras, de alguns conceitos, sem os quais fica por perceber a crise na sua total dimensão europeia e global.

Palavras que lhe faltam quase sempre: o capitalismo actual , a ideologia neoliberal, a desregulação catastrófica dos mercados no Consenso de Washington em 1983, Maastricht como institucionalização do triunfo da visão neoliberal na Europa e finalmente uma análise das dívidas como aspecto essencial do triunfo do capitalismo financeiro. Este projecto inicial consistiu em transformar as populações em consumidores compulsivos com dinheiro virtual: Compre agora! 0% de juros. 

Depois da crise de 2008, o outro lado da moeda neoliberal: dinheiro virtual afinal inexistente, bancos em crise, recapitalização do sistema financeiro à custa dos impostos dos Estados e plano na Europa neoliberal para fazer baixar os salários de grandes camadas da população do Sul. 

Sem isto fica difícil perceber por que é que não é apenas Portugal que sofre este tipo de ataques, que sucumbe debaixo da troika global, que outros países com vidas políticas internas muito diferentes e sem a peculiar ignorância e incompetência do governo terrorista social que temos, apesar disso, defrontam igualmente programas de austeridade e problemas muito similares. 

Cada país tem de travar as suas lutas próprias, é certo, mas num momento como este é forçoso compreender o carácter sistémico do projecto dos países do Norte, da Alemanha em particular: o empobrecimento das populações do Sul da Europa e, sobretudo, é preciso dizê-lo bem alto. Caso contrário, ainda caímos na asneira de pensar que é tudo "culpa de Gaspar". Não é, tal como antes não foi tudo "culpa de Sócrates". Pensar com bodes espiatórios é uma tentação. Mas, se assim fosse, teríamos de lhes atribuir poderes deveras extraordinários: estes dois culpados em Portugal, mas também na Grécia, na Espanha, na Itália, na Irlanda, em Chipre, mesmo em França e na Inglaterra? Não me parece que isso tenha sentido. Eles têm responsabilidades locais. Gaspar é mão (radical e cega) que executa o plano europeu mais vasto que põe em perigo o estado social e a democracia, não apenas aqui, mas em todo o lado. 

Se a Europa está a mudar, como dizem alguns, então que mude de forma que se veja, que se sinta, e mais depressa. Só conversa não chega. Por isso, como desconfio de anúncios mil vezes repetidos, só vendo. Antes de ver, prefiro não acreditar já. Para terminar é raro - pelo menos para mim - ouvir Pacheco Pereira referir estes aspectos cruciais. É uma pena porque é o capitalismo e o seu estado actual de guerra que permite explicar a maior parte das coisas que se passam (parece-me). 

António Pinho Vargas

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