Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, ela académica e ele ex-quadro de topo
do FMI, publicaram um livro influente sobre a dívida ao longo da
história (“This Time is Different”, já foi traduzido em português). Já
citei esse livro quanto à sua demonstração de que quase todos os países
desenvolvidos já renegociaram e reestruturaram unilateralmente as suas
dívidas, quando precisaram de o fazer.
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Mas o que agora está sob grande atenção pública nos Estados Unidos é
outro argumento: o de que os países mais endividados têm menor
crescimento, que resumiram num artigo com grande impacto, "Growth in a
Time of Debt". Os republicanos têm citado esse artigo para fundamentarem
a sua proposta de proibição de acréscimos da dívida pública.
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Ora, o artigo está errado. A sua base de dados foi mal concebida, a
folha Excel em que fizeram os seus cálculos foi mal programada, a
estatística é defeituosa e as conclusões não são verdadeiras. Michael
Ash, o diretor do departamento de economia da Universidade de Amherst em
Massachussets, com dois colegas, publicou uma crítica devastadora sobre
o trabalho de Reinhart e Rogoff: http://www.peri.umass.edu/236/hash/31e2ff374b6377b2ddec04deaa6388b1/publication/566/
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O que esta crítica demonstra é que os países estudados e com mais de
90% de rácio de dívida/PIB não tiveram, entre 1946 e 2009, um
crescimento médio de -0.1% (como tinham calculado Reinhart e Rogoff) mas
sim de 2.2%. Esse crescimento foi menor do que o dos países sem dívida
significativa (que atingiu 4.2%): foi cerca de metade. Mas houve
crescimento e, portanto, a dívida alta pode não estar relacionada com o
colapso da economia: simplesmente, depende de como é paga, do juro, do
financiamento futuro e das decisões económicas e políticas. Para mais,
há diversas razões para as diferenças entre as taxas de crescimento e
podem ser o inverso do que sugerem Reinhart e Rogoff: o crescimento
baixo alimenta a dívida, porque pequena receita fiscal cria défice. Ou a
sangria provocada pela perda de recursos públicos para o pagamento da
dívida, despesa que pode não ter efeito na economia nacional, acentua as
dificuldades e as recessões.
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Por outro lado, este artigo crítico demonstra como o crescimento (e a
dívida) variam intensamente com o ciclo económico: de 1946 para cá houve
um período de grande crescimento e vários períodos de recessão intensa e
de desaceleração. E reforça portanto o argumento contra a austeridade,
que está a criar a recessão de 2013.
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