"ODIOSA", sim ou não?
Carlos Leça da Veiga *
aeiou.expresso
quarta feira, 5 de outubro de 2011
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No decurso de muitos anos, todos os Estados que recusaram pagar as dívidas inculcadas, negaram quaisquer responsabilidades e invocaram a dum regime político opressor, colonizador e ditatorial, autor dos desmandos e ilicitudes responsáveis pela efetivação das dívidas que, como assim, deviam ser remetidas aos emprestadores por, eles mesmos, estarem comprometidos com os maus tratos políticos impostos às populações. Com a "Sentença Olmos" - destinada à resolução, no pós ditadura militar, da situação financeira da Argentina - houve uma alteração jurídica muito significativa ao ficar estabelecido que as instituições financeiras (no caso, FMI e BM) e as empresas multinacionais passavam a poder ser consideradas comparsas causadoras ou apoiantes inquestionáveis das políticas, ativas ou passivas, conducentes á necessidade de obtenção de créditos para a satisfação de fins ilícitos, exatamente, o que aconteceu em Portugal. Bastará recordar o betão e o cimento "ad libitum", a desativação deliberada de todo o aparelho produtivo nacional, os incentivos desmesurados - escandalosos - ao consumismo, aqueles, não menos recomendáveis, para a obtenção de créditos bancários, as importações excessivas ou sumptuárias e, não esquecer, toda a espécie de escândalos de corrupção que, bem conhecido, nunca sofreram consequências jurídicas de quaisquer ordens.
Argumentar-se que, em Portugal, os sucessivos poderes legislativos, executivos, judiciais e presidenciais, afinal, os responsáveis últimos pelos empréstimos pedidos e conseguidos, não eram poderes ditatoriais por terem sido eleitos - Hitler também foi - é um desculpa que, embora colha, já não é bastante para ilibar. Depois da "Sentença Olmos", mesmo que, no nosso País, de facto, o democratismo seja a feição politica julgada imperante, isso deixou de bastar para poder recusar-se a designação de "odiosa" para as dívidas contraídas se elas, como é uma exigência básica, não tiverem sido dadas a conhecer à população, tudo feito com a máxima clareza dos seus contornos íntimos, daqueles inerentes à sua necessidade, dos seus condicionalismos próprios e, não menos importante, de todos os meandros e destinos da sua utilização.
Hoje em dia, o caráter "odioso" duma dívida, como a que aflige os portugueses, face ao entendimento jurídico que resultou da "Sentença Olmos" passou, também, a poder ser atribuído aquelas geradas por causa dos comportamentos gananciosos das instituições financeiras e das empresas multinacionais, organismos passíveis de poderem considerar-se autores dum ato hostil contra o povo. O bem conhecido alheamento duma grande instituição bancária nacional não pode remeter as suas responsabilidades para o bolso dos contribuintes portugueses!
Muito felizmente, face à evolução atual do pensamento jurídico, as contingências económicas e financeiras decorrentes das manobras internacionais desses emprestadores até já podem ser consideradas, por exato, como verdadeiros atos de guerra cometidos sobre uma população - a portuguesa é mais um exemplo - e em que as vítimas, se não sofrem às mãos das balas, sofrem àquelas da penúria imposta e imposta por tempos infinitos. Do IIIº para o IV Reich, um passo não muito complexo!
No caso português, à luz da lei internacional, é difícil duvidar-se que a dívida não possa ser classificada como "odiosa" e, isso, pelo facto de ter sido cometida por uma governação política com propósitos pouco ou mal esclarecidos, muitos interesses escondidos e que, sem margem para dúvidas, não serviam os interesses nacionais. Se servissem, a população eleitora - mesmo, como foi, num número reduzido - não mostrou querer avalizá-la. Que irá fazer com os sucessores?
*Médico
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