por Miguel Szymanski (autor convidado do Aventar)
Como europeu dos quatro costados (avô português + avó meia catalã meia alemã; avô austríaco de ascendência polaca + avó da comunidade alemã checa) esta Europa começa, outra vez, a meter-me medo. Claro que a Europa dos meus quatro costados já passou por pior. A minha avó paterna dizia-me que tinha mudado três vezes de país à força das armas sem sair da cidade onde nasceu (Pilsen/ actual República Checa). O meu avô paterno, médico, passou anos a trabalhar com serras de ossos num hospital militar em Viena. A minha outra avó tomava conta das crianças no jardim de casa com uma arma automática em cima da mesa, para se defender em caso de ataque, enquanto o meu avô comandava uma companhia de soldados famélicos.
A Europa já esteve pior. Depois formou-se como cartel industrial para carvão e aço e é sobre esse cartel que assentam as actuais instituições da UE. A democracia de Bruxelas é a de um grémio industrial pela batuta do seu sócio mais rico, Berlim.
Graças a essa federação, sob a supervisão dos EUA, a Europa ocidental deixou de fazer guerras dentro das suas fronteiras. Começou nos anos 50 a exportar os seus produtos como nunca antes. E a prosperar com as exportações. Carros, máquinas e armas. Muitas armas.
O cartel industrial da Europa começou a exportar miséria na forma de ferramentas para fazer guerras, carros blindados, tanques, explosivos, navios, aviões, submarinos, todo o tipo de armas de fogo, de minas e mísseis. Milhares de milhares de milhões de euros de dezenas de países arruinados entraram nos cofres da Europa nas últimas décadas. Agora essas exportações revelam-se como um tiro pela culatra em câmara lenta. As vítimas das guerras fogem aos milhões, do norte de África, Afeganistão, Iraque, Síria, e arriscam as suas vidas para se refugiarem na Europa.
E o que faz o cartel do carvão e do aço? O que fazem os burocratas de Bruxelas? Fazem cálculos aos rolos de arame farpado para proteger as suas fronteiras e desenham estratégias sobre como evitar o desembarque de miseráveis nas suas costas. Os europeus mais básicos, também aos milhões, descobrem o seu “patriotismo contra a islamização da Europa”. A globalização da miséria e da guerra ameaça agora a própria integridade da Europa.
A Europa terá que pagar a factura. Ou assume o primado dos direitos humanos ou usa bulldozers e armas contra os refugiados. Temo que os tão proclamados valores universais do Ocidente não passem de uma farsa. Hitler, Franco, Mussolini, Salazar e companhia foram ontem, os seu netos andam outra vez pelas ruas.
Não são esses os meus quatro costados.
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