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21/08/15

do conceito do trabalho ..

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O FUTURO DO TRABALHO [Albert Jacquard]
Tradução/transcrição do discurso deste vídeo por Carlos Teix

Receio muito uma definição geral - que será necessariamente vaga e convirá a qualquer coisa. Porque, em última análise, a palavra TRABALHO é tão usada, que já nada sabemos do seu significado.

Em vez disso, o que proponho é adoptar uma definição muito restritiva, muito precisa. E para tal, começar pela etimologia. E a etimologia é conhecida: remete para a palavra latina TRIPALIUM.

Tripalium é um tripé. Objecto usado na antiguidade para torturar animais ou homens. O trabalho, inicialmente, é tortura. E alem disso existem certas frases que confirmam o sentido dessa palavra:
Nas salas de parto, nas clínicas de maternidade, o 'trabalho' é o processo pelo qual a mãe dará à luz em sofrimento. Assim, trabalho é sinonimo de tortura ... É SOFRIMENTO.

Porem, infelizmente, gradualmente, esta palavra passou a ser usada muito mais amplamente.

Proponho então que se limite o uso da palavra Trabalho (não é um exercício fácil) somente no caso de um trabalho que é tortura, algo que se impõe e ao qual nos submetemos. Só neste momento nos apercebemos, como é óbvio, de que, QUANTO MENOS TRABALHO HOUVER, MELHOR SERÁ.

Por exemplo, um professor não trabalha. Um professor é alguém numa escola que troca ... ou seja, que vive ... e, nessa altura, não é algo SOFRIDO, não é tortura. [bom, quer dizer ... pois ... talvez há anos atrás ... pois ... não, não me parece, embora perceba a ideia ...]
Idem para o actor, etc. Tanto assim que algunas pessoas poderiam dizer que não trabalham, mas que têm uma ACTIVIDADE.

Isto imediatamente coloca o ênfase na falta de trabalho que lamentamos cada vez mais, quando, em vez disso, deveríamos era estar contentes!

O desemprego tornou-se na ausência de uma função, na ausência de um papel e eu acho que seria muito melhor representar e defender os desempregados como indivíduos a quem é negado o acesso a uma função, o acesso a um papel na sociedade. Assim entende-se melhor por que é que tortura passa a ser, também, ausência de trabalho.

Há ...17 mil anos, 20 mil anos ... homens que não estavam ainda civilizados, e não trabalhavam, pintavam nas cavernas de Lascaux, Altamira, etc ...e fazendo isso deram inicio à criação da CIVILIZAÇÃO.

Civilização, é, precisamente, começar a OLHAR PARA O MUNDO DE MODO DIFERENTE.

Se imaginar ...(o que é uma ideia muito estranha) que pintar um bisonte no fundo da caverna ...bem, é intervir no resultado da caça.

Bem, tal início ocorreu 5, 6, 10 mil anos antes da invenção da agricultura e, portanto, antes da invenção do trabalho. Trabalho esse que surge muito mais tarde. Com efeito ... o trabalho para mim é um episódio na história da humanidade. Um episódio que terá durado 10 mil anos ... e que irá DESAPARECER.

Infelizmente, pouco a pouco fomo-nos habituando à crença de que ele é uma necessidade. Mas não! O trabalho NÃO É UMA NECESSIDADE! Na natureza, tal conceito não existe.
Pessoalmente, não vejo como berço da civilização a invenção da agricultura. Foi decerto algum progresso, bem ... uma nova direcção ... mas a civilização começou bem antes!

A civilização começa quando, por exemplo, surge a ideia de dominar o fogo! Esse foi um salto emocionante! ...O fogo era um inimigo e tornou-se um aliado. É também uma ferramenta! Não requer trabalho! Só vigilância. De vez em quando friccionamos uns paus ou pedras uns contra os outros - e isso não é trabalhar! ...

E acima de tudo, já nas cavernas e confortavelmente aquecidos, percebemos que tínhamos TEMPO LIVRE. Como ocupá-lo? Metemo-nos a pintar bisontes no fundo da caverna, a pintar mãos humanas! ...é incrível! ...É ISSO A CIVILIZAÇÃO ! ... nada tem a ver com trabalho! ...

Eu diria antes, pelo contrário, que a civilização começa quando nos percebemos do tempo que temos para desfrutar fazendo coisas divertidas como construir imagens ...ou inventar contos, ou religiões ... ou ainda escrever poesia ou pintar. Isso é civilização.

Ao invés disso, o trabalho é uma ... realmente, uma PERVERSÃO nesta actividade civilizadora.

A.Jacquard

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