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06/08/13

Mudar só as moscas não basta

no i
publicado em 5 Ago 2013
por Tomás Vasques *

A ministra das Finanças, cuja nomeação para o cargo esteve na origem da crise política desencadeada pelo líder do CDS-PP, acabou por se afogar na sopa dos swaps 

bad night, de Telmo Vaz Pereira
Parecia estar o governo posto em sossego, pelo menos neste mês de Agosto, colhendo o doce fruto do "novo ciclo", iniciado após as tomadas de posse do vice-primeiro-ministro, de novos ministros e de secretários de Estado, abençoadas pelo senhor Presidente da República. O processo culminou na aprovação de uma patética moção de confiança, apenas destinada a dar à luz a "nova coesão" da coligação que nos governa, expressa em sorrisos fingidos e palmadinhas nas costas cinicamente ensaiadas. Nem as sondagens publicadas nos primeiros dias deste mês da preguiça apresentavam oscilações em relação a anteriores que tirassem o sono aos protagonistas da bizarra crise política de Julho. Passos Coelho descontraiu, foi a banhos para o Algarve. O senhor Presidente da República, também. O governo, a meio gás, às voltas com os cortes na despesa de Estado para apresentar à troika, ficou nas mãos de Paulo Portas, que entretanto se instalou no palácio do conde de Farrobo. Mas, parafraseando o poeta, o sossego foi apenas engano da alma, que a Fortuna não deixou durar muito: foi denunciada a presença no governo, recentemente empossado, de um secretário de Estado altamente "tóxico". 

Dois dias depois de a senhora ministra das Finanças se ter enredado, na inútil comissão de inquérito, pela segunda vez, em duvidosas explicações sobre os swaps, e quando tudo parecia amainar, acabou-se o sossego. A revista "Visão" noticiou que o novo secretário de Estado do Tesouro, escolhido pela dita senhora ministra, tinha sido vendedor, ao serviço de um banco, daqueles contratos de gestão de riscos financeiros a empresas públicas e ao Estado, na sua modalidade mais "tóxica" e imoral: mascarar o défice orçamental e as contas públicas. Foi doloroso ver o novo secretário de Estado do Tesouro explicar aos jornalistas, num daqueles encontros propagandísticos montados pelo ministro Poiares Maduro, as suas responsabilidades passadas: não sei, não fui eu que concebi o produto, não respondo, não me lembro. A cena foi tão triste de se ver, o embaraço e a pedra no sapato foi tal, que até um dos nossos conselheiros Acácios, o comentador Marques Mendes, veio defender a demissão do homem. É caso para dizer que a senhora ministra das Finanças, cuja nomeação para o cargo esteve na origem da crise política desencadeada pelo líder do CDS-PP, acabou por se afogar na sopa dos swaps. 

Hoje é claro para quase todos o embuste da tese propalada por este governo segundo a qual a maioria dos portugueses tinha de empobrecer porque "vivia acima das suas possibilidades". O brutal empobrecimento dos portugueses, através do saque fiscal e do aumento dos transportes, da energia e de tudo o mais, a que foram sujeitos nos últimos dois anos, destinou-se sobretudo a pagar os deboches de um grupo que circula entre os bancos, a administração de empresas públicas e o governo, numa promiscuidade imoral e eticamente decadente. Tanto estão nos bancos a vender swaps "tóxicos" ao governo, como passam rapidamente para a gestão de uma empresa pública onde "negoceiam" contratos de parcerias público-privadas com os bancos onde trabalharam, como são ministros e secretários de Estado incumbidos de resolver junto dos bancos os contratos desastrosos que com estes anteriormente firmaram. 

Foi esta teia de interesses obscuros, esta gente que não está sujeita a qualquer escrutínio democrático, mas usa o dinheiro dos contribuintes a seu bel-prazer, que nos trouxe até aqui e que, a continuar, nos arrastará para uma miséria ainda maior e afundará o regime democrático. No estado em que estamos, a alternativa deixou de ser entre austeridade e crescimento. A alternativa é entre a decência, a moral e a ética política e esta pantominice que nos tem conduzido à desgraça. Se mudarmos só as moscas, fica tudo na mesma. -- fonte

*  Jurista, escreve à segunda-feira

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